sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Uma nova era?



Confesso que fiquei extremamente emocionado com o discurso de vitória de Barack Obama. Tranqüilo, sereno e eloqüente, como nos acostumamos a vê-lo. O momento da família negra sobre o palco, aplaudidos efusivamente foi primoroso. Pensei comigo: a negrada, finalmente, está no poder!

Na contramão, Obama jamais assumiu ser o candidato negro, defensor público dos direitos afro-americanos propostos por significativas figuras durante a história americana, direitos estes mais do que justos, pois o desafio histórico necessitou um candidato que, voluntariamente, precisou fazer-se de sonso e renegar a história, para ser aceito pelo restante da massa a qual, com minoria significativa, é sensível e não demagoga à segregação americana. Para se ter uma idéia, Obama ao fazer referência a Luther King, não costumava citar seu nome, dizia: "o jovem pastor da Geórgia”.

Quando o republicano Abraham Lincoln assumiu a presidência do país em 1860, ele deparou-se com um país dividido por ideologias conflitantes. O sul, de clima quente e solo fértil, investiu pesado na plantação do tabaco – aprendizado difundido durante a conquista espanhola nas terras Astecas – e, conseqüentemente, utilizou larga quantidade de escravos oriundos da África. Posteriormente, a cana-de-açúcar popularizou-se igualmente, propagando o estilo de vida rural na região. Já o Norte, com clima frio e solo rochoso, impedidos da prática da agricultura, buscou outras fontes de renda, as quais culminaram no desenvolvimento da indústria e manufatura, através da proibição da escravidão. Por conseguinte, o nível de desenvolvimento social e econômico do Norte em relação ao Sul foi acachapante, mesmo considerando o rápido e elevado progresso dos sulistas. Assim, em 1861, os Estados Unidos estavam divididos em 19 Estados livres, adeptos ao impedimento da escravidão e 15 Estados, partidários à prática.

Com o fim da guerra (Secessão - 1861 / 1865), responsável pela morte de 500 mil soldados, e a vitória do Norte, os sulistas revoltosos fundaram organizações paralelas com o propósito da difusão do ideal segregador e impedimento da integração social dos negros recém-libertos, como a Ku Klux Klan, no Tennessee. Devido aos métodos violentos dos babacas, suspeita-se que o nome tenha surgido com inspiração no som de um rifle sendo carregado. Para se ter uma idéia do potencial deste imaginário, David Wark Griffith, cineasta estadunidense do sul, em 1915, lança “O Nascimento de uma Nação” quando glorifica a escravatura e a segregação racial a partir do espancamento de negros e a perpetuação da servidão, apesar da fita apresentar, simultaneamente à estrutura reacionária, revoluções cinematográficas até então jamais vistas, como planos de câmera e enquadramentos. Após, e em represália ao racismo escancarado, surgiram Martin Luther King, pastor e ativista político que lutava pela igualdade por meio da não-violência e amor ao próximo, semelhante ao indiano Mahatma Gandhi e Malcom Little, mais conhecido como Malcom X, de inspiração socialista, islâmica e da violência como método de defesa, igualmente proposto por Glauber Rocha, cineasta brasileiro, em relação à pobreza e miséria oferecida aos brasileiros negros, nordestinos e latino-americanos, ataca o conservadorismo e prega a igualdade racial e étnica-cultural de maneira incisiva: pau neles!

Porquanto, a vitória de Obama é mais do que significativa. Talvez seja a maior vitória desde os últimos cem anos! Para se ter uma idéia, após o Período de Reconstrução, somente seis figuras negras fizeram parte de cargos públicos na política estadunidense: três senadores, dois governadores e a secretária de Estado Condoleezza Rice. Diferentemente de 2004, quando Bush levou a eleição com relativa folga, embasado no medo terrorista e valorização da honra americana, Obama venceu de maneira acachapante, à frente com os universitários, homens, mulheres, latinos, americanos residentes em outros países, nos colégios eleitorais, na câmara e no senado. Apenas não venceu em relação à população acima dos 56 anos.

No entanto, após a festa regada a champanha, Obama acordará com uma tremenda dor de cabeça. Isso porque herdará do governo Bush uma economia em recessão, guerras inconclusas e o até então inabalável prestígio americano em frangalhos. E é aí que Obama pode se complicar!
O sustento de sua campanha foi, grosso modo, estruturado com promessas acerca da retirada das tropas do Iraque, da abertura da saúde à universalização, de um ousado plano de energia, discussão sobre a regularização dos imigrantes e a reavaliação das técnicas de interrogatório utilizadas em Guantánamo.

Segundo estatísticas oficiais, o PIB (Produto Interno Bruto) caiu 3,1% no último trimestre o qual, nos Estados Unidos, é movimentado principalmente através do consumo individual, que chega a corresponder ¾ deste levantamento. Ao mesmo tempo, as tropas americanas, no Iraque e Afeganistão, atuam quase em seus limites e o maior parceiro americano, a OTAN (Organização do Tratado Atlântico Norte) não parece disposta ao envio de mais soldados a região, apesar do fortalecimento do Taleban e da Al Qaeda.

Contudo, Guantánamo, em Cuba, segundo a organização dos direitos humanos Human Rights Watch (HRW) é a maior questão a ser tratada pelo novo presidente. A instituição acusa o governo Bush de ferimento aos direitos humanos e que, imediatamente após a instauração do novo governo, sejam rechaçadas às práticas de tortura efetuadas pela Agência de Inteligência Americana (CIA).

Em relação à América Latina, Obama provavelmente será mais flexível, e tentará uma reaproximação do continente. Até Hugo Chávez, presidente da Venezuela, comemorou a vitória democrata: “… estamos convencidos de que chegou a hora de estabelecer novas relações entre nossos países e com nossa região, sobre as bases dos princípios do respeito à soberania, a igualdade e a cooperação verdadeira”. Não obstante, o fato de um afro-descendente ter chegado à Casa Branca não quer dizer que sua postura, que apenas teoricamente é mais humana, seja tão imperialista e isolacionista quanto à de George Bush.
Esperemos o desenrolar dos fatos.

Porém, fica evidente que a maior vitória, a partir desse panorama, é a ausência de George Bush do poder!

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